Publicado 03/12/2014
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Atualizado 22/10/2017
Sabe aquele turista que invade a praia com mil e uma sacolas, prepara o rango como se estive na cozinha de casa, deixa latinha espalhada na areia, não recolhe o próprio lixo e coloca a música do carro no último? Não, ele não é farofeiro. Ele é sem educação. Gente que desconhece a palavra cidadania e não sabe o que significa respeito ao próximo.
Por causa de tipos assim muitos viajantes sentem-se constrangidos em levar o próprio lanche ou bebida de casa. Algo absolutamente comum tanto na Europa quanto nos Estados Unidos, seja quando viajamos de avião, carro ou ônibus. Aqui, preferimos pagar R$ 15 num pão de queijo com café no aeroporto a montar uma marmitinha saudável com iogurte e sanduíche natural comprados no supermercado pela metade do preço.
Ser chamado de farofeiro é ofensa mortal para o turista emergente. Entendo. Quando saímos de férias subimos na vida. É nosso momento-patrão. Qualquer adjetivo que nos associe ao modus operandi considerado suburbano é insulto, quase uma afronta moral. É necessário pagar — quanto mais caro, melhor — para ser aceito no universo dos novos ricos viajantes. Só que não.
Nada mais digno do que o poder de escolha. Montar o próprio farnel pode ser um ato de inteligência que nada tem a ver com pão durice ou chinelagem. Ora, atravessamos o oceano para fazer piquenique no Jardim de Luxemburgo em Paris — muitas vezes com o intuito de economizar na janta. Mas fazer a mesma coisa num parque tupiniquim, porém, é considerado coisa de pobre indigente.
Sou farofeira de raiz. Sempre que posso levo minha matula. Nada muito complicado. Saunduichinhos, cookies integrais, castanhas, iogurte natural, suco orgânico, chocolate amargo e água. O meu kit- sobrevivência traz diversas opções, é bem mais saudável e custa a metade do preço do combo vendido nos voos nacionais (sanduba de presunto e queijo, refri e batata chips) ou em lanchonetes de beira de estrada.
Vale também para quando a espera no aeroporto é longa.
Não se trata de avareza. Sou uma muquirana com limites até. Mas tenho tarimba no assunto. A questão é bem mais ampla. Estamos falando do exercício da liberdade, intrínseco ao ato de viajar. Da nossa capacidade de dizer não à lata de cerveja de R$ 10 sem temer julgamentos ou sem se sentir menor ou mais pobre por isso.
Não tenha vergonha do seu isopor na praia ou da sua marmita itinerante. Mais do que seu status, eles devem refletir sua indignação. Artigo de luxo é ser cidadão. Ter medo de parecer farofeiro de raiz é complexo de inferioridade. Ostentar, aliás, é – antes de tudo (e qualquer viagem) – dar valor ao próprio e suado dinheiro.
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